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Quando o corpo é música


Você sabe o que o Barbatuques é?/ É uma banda que toca da cabeça ao pé/ Peito, estalo, palma, estalo/ Pança, coxa e pé/ Mão na boca, mão na bochecha/ Tudo junto de uma vez. Com estes versos de “Que Som?”, João Simão bem define o grupo.Sob liderança do músico Fernando Barba, o Barbatuques é André Hosoi, Bruno Buarque, Marcelo Pretto, André Venegas, Dani Zulu, Flávia Maia, Giba Alves, João Simão, Lu Horta, Helô Ribeiro, Mairah Rocha, Maurício Maas, Renato Epstein e Charles Raszl.Quanto mais mãos e pés, tantos mais sons são alcançados, mais ruídos viram música, mais ritmos falam à alma, mais vozes entoam cantos e mais ouvidos sentem a força do barulho virando sinfonia, virando batucada, virando dança, se virando em nuvens, revirando fumaça, refazendo o canto, renascendo em música. Tum Pá tem catorze faixas muito bem mixadas. Algumas são típicas do repertório infantil; outras, compostas para incrementar esse universo. Algumas obras se sobressaem; mas todas têm o mesmo senso estético-musical, soam a partir de um conceito sabiamente pré-definido. Isso, além de facilitar a concepção corporal, torna-a mais instigante.No disco há dois corais de crianças (um de São Paulo, outro do Cariri, no Ceará) que têm participação marcante em algumas faixas, principalmente na primeira, “Tanto Tom” (Helô Ribeiro), e em “Tum Pá” (Lu Horta), que dá título ao CD.“Samba Lelê”, “Escravos de Jó”, “Borboletinha”, “Marcha Soldado”, “Peixinhos do Mar”, “Marinheiro Só”, não obstante serem manjadas, têm arranjos que as transformam em deliciosas novidades. Principalmente quando se unem “Borboletinha” a “Marcha Soldado”. Os instrumentos vão sendo apresentados: primeiro três percussões, depois o baixo, as guitarras um, dois e três, o violino, a viola e o trompete, e os vocalistas tratam de imitar cada um dos sons. Formada a orquestra corporal, o coral infantil canta “Borboletinha”, logo depois, “Marcha Soldado”, e para finalizar, cantam as duas cantigas ao mesmo tempo. Show de bola. Sempre que ouvia o Barbatuques, pensava-os como crianças curiosas que buscam descobrir no corpo limites misteriosos, indecifráveis. Daí o trabalho infantil de agora ser o desdobramento natural de uma trajetória que haveria de nisso chegar, mais cedo ou mais tarde. Pois quem, se não os pequenos, para sentir como música uma música que nem parece música, mas apenas uma simples batida da palma da mão na bochecha, dela tirando um som engraçado? Os adultos até entendem, mas sentir, só as crianças. E agora o Barbatuques reproduz o mundo delas, onde mora a esperança de só haver sempre coisas boas e novas. Sem amarras que lhes tolham a inventividade, surpresa sendo a tônica dominante: para eles, corpo é música.Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4