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O som e o silêncio de Mauricio Pereira


Mauricio Pereira é cidadão de uma São Paulo que lhe abriu as portas de sonoridades intensas. Homem de múltiplos interesses e ações; músico, saxofonista, poeta, letrista, arranjador, produtor de idéias e de sonhos, Mauricio não é de respeitar limites pré-postos. A música tem significados que para ele parece não haver necessidade de desvendar – perderia a graça se assim fosse. A música para Mauricio tem sabor da brincadeira que não pode ser interrompida, sob pena de a meninada criar um banzé dos diabos; as letras de suas canções estão sempre disponíveis para alegrar e contagiar as travessuras – inconseqüentes, graças a Deus –, da molecada de uma cidade que já não existe. Cidade que Mauricio Pereira traz na cabeça e na alma musicais. Moço a fazer de sua arte algo que não se define; algo que não se desfaz, apenas refaz-se em música, naquilo que dá na bola do poeta que improvisa e traduz o dia-a-dia aparentemente desprovido de poesia e sonoridade.Neste que é o seu quarto disco, para revelar sua safra de composições atualizada, Mauricio conta com um quarteto com formação típica do pop rock urbano: Leandro Paccagnella, bateria; Mano Bap, baixo; e Tonho Penhasco e Luiz Waack, guitarra, violão de náilon e aço, e guitarra portuguesa. E tem também as participações especiais: André Abujamra, Skowa, Daniel Szafran e a poeta curitibana Alice Ruiz. “Pra Marte”, parceria com Daniel Szafran, que abre o CD, é um samba com levada de choro que dá aos versos o contraponto que precisam ter para ainda mais seduzir com sua tamanha modernidade: “E me sentir feito um foguete/ Que prosseguiu subindo/ Pra Marte/ Onde te viu sorrindo/ E é lindo/ Um foguete querer-te e ter-te/ E infindo...” Skowa toca pandeiro, Luiz toca violão de aço, Tonho toca o de náilon, lembrando um regional tradicional, enquanto a voz de Mauricio se encarrega de dizer a letra poética, como a demonstrar que tradicional ela não é... Mas é! É?E vêm “Motoboys, Girassóis, Etc. e Tal”, “Ser Boi”, “Trovoa”; e Mauricio escancara seu jeito pop de se ver no mundo. É quando se percebe com clareza que a pegada da batera de Leandro é fundamental para o ar do CD. Tem “Pranto Para Comover Jonathan”, parceria de Mauricio com Adélia Prado, simplicidade reforçando simplicidade; melodia adensando versos... Música. Tem duas modas de viola: “A Loira da Caravan”, fantasia sobre uma visão no meio da madrugada, após um desastre de automóvel, envolvendo o autor e um violeiro de nome Paulo Freire, e “O Dourado”, uma parceria de Mauricio com André Abujamra que cantam em terças “caipiras”. Não dava para resistir, pois pra mode cantá moda, cantadô tem di tê ôtro cantadô pra cantá junto e ajudá o ôtro a mió cantá as moda. E assim foi que Os Mulheres Negras se refizeram. Ao menos por um dia. E tem “Toscana”, letra escrita metade em português, metade em italiano; metade sol, metade lua; integral beleza resumida nos versos: “Canções das quais só se escuta os silêncios”. A sensação que se tem ao ouvir Pra Marte é a mesma que costumam ter os que se deixam gostosamente surpreender pelo inesperado. De paulistanidade em paulistanidade musical e poética, as faixas do CD vêm. E espantam, incomodam, atiçam. Diante de achados que se sucedem em vertiginosa avalanche de “estranhezas” poéticas, melódicas, harmônicas, instrumentais e vocais, resta deixar que tudo surja, que tudo venha, que tudo emprenhe os ouvidos e de lá vá à alma de quem ama o novo, se o novo lhe aparece.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogo de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .